número 34 (3-4) / 1994
Aproximadamente seis meses após a realização do 1.º Congresso de Arqueologia Peninsular, eis o 4.º volume das Actas, totalizando, até ao momento, cerca de 2.000 páginas publicadas. O 5.º, embora em termos formais já referente a 1995, sairá do prelo, segundo a nossa previsão, ainda em 1994, se para tanto se conjugarem as condições favoráveis. Está aqui mais uma vez a prova de que Portugal tem instituições e pessoas com experiência organizativa (apesar dos magros recursos, e de tudo se fazer à custa de um esforço de alguns indivíduos trabalhando amadorística e artesanalmente, esforço esse que não é, habitualmente, "contabilizado", nem, a médio prazo, sustentável) para levar avante reali-zações de grande monta e qualidade científica, de prestígio internacional, desde que minimamente apoiadas, e fazendo uma gestão séria dos meios disponíveis. Mas, se estas minhas palavras visam superar atitudes derro-tistas, não devem ser tidas, como aliás já se insinuou, pela afirmação de que as coisas vão bem neste domínio. Sejamos claros, embora sem a pretensão de fazer aqui, a despropósito, o diagnóstico da grave crise em que, como arqueólogos, nos encontramos, e que constitui o pano de fundo em que este Congresso ibérico se efectua e se publica. A Arqueologia portuguesa precisa de quase tudo, particularmente um financiamento condigno e a disponibilização de instrumentos técnicos e logísticos; aqueles com que tem trabalhado são uma vergonha nacional. Mas, se algum "capital'' importante tem, esse são antes de mais as institui-ções a que acima me referi e os próprios arqueólogos que as integram, com a capacidade de iniciativa e de trabalho qualificado - a maior parte das vezes prestado a título gratuito, realidade rara nos nossos dias - de que têm dado mostras ao longo dos anos. Por muito adversas que sejam as suas condi-ções de actuação, a nossa pequena comunidade de arqueólogos não tem baixado os braços e não se tem poupado a esforços para fazer um trabalho que honre o país e de algum modo colmate as insuficiências - públicas e notórias - do próprio Estado. Temos pois jus a um tratamento de respeito por parte dos responsáveis pela política da Cultura e a uma visibilidade junto da opinião pública que passa pelo reconhecimento de uma profissão, a qual necessita de preparação científica específica nos seus vários escalões, em detrimento da imagem romântica que a nosso propósito é ainda por vezes anacronicamente construída, relacionando a Arqueologia com um entretenimento de tempos livres, motivado pela excitação da "descoberta" que auto-satisfaz individualisticamente. Essa imagem é ridícula e imprópria de pessoas minimamente cultivadas e advertidas para o papel da Arqueo-logia no saber contemporâneo e na preservação de um meio onde valha a pena viver, e do qual não sejam portanto sistematicamente arredados os sinais da memória colectiva, como está a acontecer diariamente. Ao mesmo tempo, devemos reconhecer a importância que têm tido as Universidades e as pessoas que as integram na implantação de uma Arqueologia prestigiada em Portugal. Elas têm o seu papel próprio (embora, num mundo como o de hoje, tudo se encontre em mutação), e não podem, nem estarão em princípio vocacionadas para fazer face a variadíssimas e prementes questões que têm de se constituir em serviço público perma-nente no âmbito do Património, tanto ao nível do poder central como das autarquias; mas, em última análise, directa ou indirectamente, elas são as detentoras de um capital científico que é o avalizador final de todas as acções. E, sobretudo, a distinção entre "investigação" (que estaria acanto-nada nas Universidades) e "serviço público" (que competiria ao organismo que tutela o património cultural) é perversa, porque reduziria ambas as instituições à impotência: a primeira pensando sem poder actuar, a segunda actuando sem poder pensar; e as duas dilapidando o nosso património maior, que é a imaginação dotada de meios de se cotejar com a actuação prática, das pessoas concretas, preparadas, de que dispomos, e que constituem um bem escasso e infinitamente precioso, porque são elas que actuam utilmente, não quem empiha processos nas secretárias, em alguns casos eventualmente compensando as suas frustrações (muito compreensíveis!) com o atraso da vida de outros. No caso do 1º Congresso de Arqueologia Peninsular, está também mais uma vez provado, à exaustão, que uma das formas de desenvolver a nossa Arqueologia é descentralizar, dotando de um mínimo de capacidade de actuação instituições (existentes ou a criar) dispersas pelo país (desde que possuam credibilidade científica), e não procurando controlar tudo a partir de Lisboa. E, entre os múltiplos, e graves, problemas pendentes da Arqueo-logia, os quais deveriam merecer uma muito mais aturada atenção das autoridades, mas também a reflexão autónoma dos arqueólogos, é evidente que se encontram a política editorial neste sector (a todos os níveis) e a da organização de congressos e outras reuniões promotoras de debate e de difusão de conhecimentos e de ideias, sem os quais é o marasmo. A ultrapassagem do nosso isolamento e da nossa tendência para o anacronismo nos métodos e objectivos passa pelo diálogo com os nossos parceiros numa esfera cada vez mais alargada; e esse alargamento não pode, nem deve, contornar os vizinhos espanhóis. O intercâmbio com o Estado espanhol e as suas várias autonomias é hoje uma condição impres-cindível de afirmação da identidade nacional, no seio da Península e da Europa; como é obvio, essa identidade não se pode construir autistica-mente, por fechamento (seria absurdo, principalmente dada a grandeza da Espanha e a força com que a sua economia está penetrando em Portugal), mas em disponibilidade de abertura e sobretudo em obras concretas que plasmem não uma intenção, mas uma colaboração já em marcha. Colabo-ração de igual para igual, em que o nosso país não vá sempre atrás de outras iniciativas, mas também lance acções capazes de encontrar eco peninsular, porque correspondentes a uma necessidade real, sentida. Precisamos de fazer, fazer, fazer, e não discutir eternamente como seria a forma ideal de fazer; e assim, pela experiência de choque com a realidade, que nos surpreende sempre, nos iremos constituindo. O nosso desejo como instituição, e o meu pessoal, é de que o "fer-mento" que estamos deixando nestes volumes, com tanto esforço e ânimo regularmente publicados, contribua, por um lado, para o elevamento do estatuto público da nossa Arqueologia e, por outro, para o desenvolvimento de acções concretas de cooperação entre arqueólogos portugueses e espa-nhóis. Tudo isto tem, no estilo e nos objectivos, alguma coisa de idealismo, mas a mim - ou não fosse um homem muito ligado à terra, à sua materia-lidade e resistência - o que me importa é o lastro de pequenas transfor-mações (por vezes quase indizíveis) que apesar de tudo se deposita quando as grandes palavras se esgotam. Que cada um cumpra, o melhor que pode, o seu papel - e a mais não será obrigado. Porto, Fevereiro de 1994 Vítor Oliveira Jorge Secretário-Geral do Congresso para Portugal |
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Preâmbulo Vítor Oliveira Jorge As indústrias líticas pré-históricas do Litoral do Minho (Portugal) e o seu quadro litoestratigráfico J. Meireles Paleolítico da Serra de Sicó Thierry Aubry, Maria Helena Martins Estudio de la necrópolis del grupo de Sepulcros de Fosa del yacimiento de «Bàbila Madurell» (Sant Quirze deZ Valles, Barcelona) en el contexto del Neolítico medio reciente en Catalunya Roser Pou Calvet, Miquel Martí Rosell, Jaume Díaz Ortells, Anna Bordas Tissier La relación hombre/espacio en el horizonte megalítico de la Lora (Burgos) Manuel Angel Rojo Guerra El megalitismo en Cantabria en el contexto de la Cornisa Cantábrica Luis César Teira Mayolini A primeira metade do 3.º milénio no Centro/Sul de Portugal: algumas breves reflexões, enquanto outras não são possíveis Victor S. Gonçalves Pesos de tear e tecelagem no Calcolítico em Portugal Mariana Diniz Origen y desarrollo del Horizonte Cogotas I en el Alto Tajo M.ª Concepción Blasco Bosqued A transição do Bronze Final/Ferro Inicial no povoado de S. Julião - Vila Verde: algumas considerações Ana M. S. Bettencourt Estructura social y territorio en la cultura castre fia prerromana M.ª Dolores Fernández-Posse, F. J. Sánchez-Palencia, J. Fernández Manzano, A. Orejas Estudio crítico de la cultura castrefía asturiana Elías Carrocera Fernández Bracara Augusta, ville latine Patrick le Roux La mano de obra en la mineria romana del Noroeste Peninsular F. J. Sánchez-Palencia, A. Orejas, M.ª Dolores Fernández-Posse Un taller de útiles óseos de la Legion IIII Macedónica Cesareo Perez Gonzalez, Emilio Illarregui Gomez Os Banhos Públicos da Liberalitas Iulia Ebora. Algumas notas sobre o seu estudo Panagiotis Sarantopoulos La ciudad de Arcávica en época visigoda: fuentes !iterarias y testimonios arqueológicos Rafael Barroso Cabrera, Jorge Morin de Pablos Algunas consideraciones sobre el siglo VII en el entorno circumpirenaico occidental A. Azkarate Garai-Oiaun Os castelos de taipa do período muçulmano no Sul de Portugal: o exemplo de Salir (Loulé) Helena Catarino Obras constructivas en al-Andalus durante el Emirato de Muhammad I segun el volumen II del Muqtabis de lbn Hayyan Juan A. Souto Los rubut de al-Andalus: un ensayo de localización Carmen Martínez Salvador Silos medievales de Monzon de Campos (Palencia) Carlos Lamalfa Diaz, Aurora la Cruz Pérez, M.ª Julia Crespo Mancho Las pueblas fronterizas entre León y Portugal en los ss. XII y XIII: «ciudadelas» de Riba-Côa (Beira, Portugal) José Avelino Gutiérrez González, Carmen Benéitez González, Hortensia Larrén Izquierdo Datações de radiocarbono relacionadas com o património arqueonáutico em Portugal Francisco J. S. Alves, António M. Monge Soares, João M. Peixoto Cabral, Mário Mário Varela, Maria Isabel M. Ribeiro A Antracologia em Portugal: progressos e perspectivas Isabel Figueiral Fitoarqueologia: uma interface botânica T. Mouga, M. T. Almeida La Geoarqueología en Espana hoy Jesús F. Jordá Pardo O método eléctrico da resistividade aplicado à Arqueologia. Tratamento de sinal Jorge M. C. Machado de Carvalho, Abílio Tinoco Cavalheiro Datação de micro-quantidades. Técnica de AMS António M. Monge Soares Sobre a desvantagem de não haver convenções adequadas nas ciências históricas para referir datas determinadas por métodos físicos João M. Peixoto Cabral |